Diretor Ivo Moreira  \  Periodicidade Mensal
segunda, 19 março 2018 19:36

O que fiz para estar onde estou

A música é o que nos faz ser DJs? 

Todos sabemos que hoje a indústria da música eletrónica atravessa um período de mudança - o que é bom para uns e maus para outros. Em todas as formas de arte há tendências, o público segue-as e dependemos do público para "vingar" neste ramo. A música tem um período de consumo muito mais rápido se comparado a anos passados. Não me quero alongar nesta questão, mas há forma de contornar isso? 

A minha carreira de DJ/Produtor começou há 6 anos atrás. Nunca imaginei poder trabalhar com grandes artistas, nem lançar em grandes editoras como Lokosound ou Revealed. Para mim era sem dúvida algo muito distante, sobretudo olhando para o estado do mercado: muito saturado de demasiada informação desnecessária e com escassez de música. Será que se perdeu o que realmente me fez passar horas agarrado ao computador? 

Já tive muitos fracassos, e já ouvi muitos “nãos” e ainda acontece - porque acontece a todos - mas as “derrotas musicais” não se superam com uma foto no Instagram, nem tão pouco com likes. De certo que sobe a auto-estima e que alivia o processo de focagem noutro passo. 

Estou a dar a minha opinião, não quero discordar de ninguém que diz o contrário. Claro que todos nós sabemos que as redes sociais têm um peso enorme na carreira de um artista e que hoje talvez até tenham mais peso do que a própria música. Isso não significa que precisamos de deixar de ser produtores para ser modelos - a música, como já disse, é e sempre será o mais importante. 

"Não digo que as redes sociais devem ser postas de parte, porque eu mesmo não as ponho (precisamos delas para promover o nosso trabalho e dar-nos a conhecer ao público), estou a dizer que a maneira mais fácil de não sermos postos de parte é não por de parte a música." 

 

É importante ter um Manager/Agente? Ou será mais importante ter uma equipa?

Uma das lições mais importantes que aprendi ao longo destes anos em que sigo no ramo da música, é a que temos de ser nós a “bater com a cabeça” para ver o que está mal e com quem não devemos trabalhar. 

Eu trabalhei desde sempre com o Miguel. O Miguel não é agente, nem manager, não tem formação na área: trabalha em restauração. Mas a vantagem de trabalhar com o Miguel é que ele me conhece: as fraquezas, as forças, os dias bons e maus. E o mais importante é que ele acredita tanto no "ZINKO" como eu. Por isso acredito solenemente que a formação de uma equipa forte, com base na credibilidade do projecto e na confiança mútua é um ponto-chave para tudo funcionar.

Hoje em dia sou agenciado, sim, e tenho alguém "do outro lado". Tratamo-nos como equipa, delineamos estratégias e caminhos para chegar onde queremos. Mesmo que não consigamos, amanhã tentamos novamente. 

Quem quer que escolham para a vossa equipa nunca tratem a pessoa como alguém que está a trabalhar para vocês, mas sim que está a trabalhar convosco. A importância de ter um manager ou agente passa a não ter nexo se não se tratarem como equipa. "Nenhum treinador consegue ganhar campeonatos sem jogadores", é uma mensagem simples, mas que para mim faz toda a diferença. Eu sei quem não estaria onde estou agora, talvez até mesmo a escrever um texto de opinião, se não tivesse uma equipa a trabalhar comigo. 


Enviar Promos

A parte mais importante do artista passa obviamente pela música. Podemos cada vez mais potenciar a mesma e fazê-la chegar aos ouvidos de quem queremos. O envio de promos é algo muito importante no momento em que temos uma "nova música", mas é importante termos um método adequado e prático para o fazer.
 
Alguns pontos que tenho notado quando recebo as promos no meu e-mail.
 
1 - Apresentação 
Acho que ninguém gosta de ser abordado sem uma apresentação do que vai ouvir antes - nome, idade, país, breve descrição -, mas não é preciso alongar ao ponto de escrever uma biografia inteira. Artistas como Hardwell, Afrojack, ou Martin Garrix não estão minimamente interessados se vocês têm uma casa à beira-mar, ou se o vosso cão se chama "Rex". Uma breve descrição e o link da música chega perfeitamente. 

2 - Links
Nenhum artista dos que falei há pouco vai fazer download do vosso ficheiro, por isso acho que o mais prático será enviar um link privado de Soundcloud com download activo, ou link de Dropbox. A falta de pré-escuta é um ponto crucial para a música não ser ouvida. Passados 5 ou 6 emails com anexo, o que enviarem será considerado spam,  perdendo-se boas oportunidades de serem ouvidos, porque a vossa música podia estar boa.

3 - Música
Têm de estar certos de que o que estão a enviar é o melhor que conseguem. Nunca sabemos se o artista a quem enviamos a promo vai ouvir ou não. Por isso é óbvio que um ponto que todos devem considerar é que músicas inacabadas, sem mix/master, entre outros problemas, provavelmente não vão ter feedback ou se tiverem não vai ser o que gostariam de ouvir. Isso faz com que nós fiquemos desmotivados.

Processo Criativo / Mixing e Mastering
Neste tópico certamente não há muito para dizer, pois cada um tem o seu formato de trabalho e as suas manias. Não vou falar de nada que quem faz música não saiba, contudo acho importante referir alguns pontos. Não são precisas colunas topo de gama para fazer música. Não é preciso um estúdio de milhares de euros, não é preciso um teclado midi super atual e cheio de controladores, pois a maior parte das minhas músicas foram feitas de fones, teclado do computador sentado na mesa da minha cozinha. 

É tudo uma questão de conforto. Ter um espaço organizado é o ponto, não tem de ser o espaço nem a altura, acho que naquele momento tem de se estar completamente focado no que se está a fazer - esse é o truque -, obviamente que um bom computador e um bom equipamento ajuda, mas não é o mais importante. O mais importante é sim conseguir passar a ideia da cabeça para o software. 

A música não tem tempo para se fazer, eu tenho músicas com dois anos que sofreram alterações durante esse espaço de tempo até ter o produto final com que me sinto satisfeito. A minha faixa “Footprint” em colaboração com o “Tong Apollo” saiu em novembro de 2017, a ideia da música ficou pronta ainda em 2016. Mudámos tudo, 4 drops diferentes até chegarmos ao resultado final. Já a “Guaraná” demorou três dias a ser feita e consegui assiná-la numa das maiores editoras do mundo. O que importa na realidade é a ideia. Claro que uma ideia bem executada só tem a ganhar. 

Tentar fazer algo diferente não é nada fácil, eu sei disso, sei que fazer algo num estilo muito ouvido - Big Room, por exemplo - mas que não soe genérico é complicado. As labels procuram cada vez mais ideias novas, para criar tendências, algo novo, que não se ouve no mercado. É isto que chama a atenção dos A&R´s, a meu ver é tudo uma questão de ideias e alguma sorte. 

Depois existe a segunda parte, talvez das coisas mais importantes, pode parecer que não faz diferença, mas faz: o Mix/Master é algo que vai finalizar a música. Por vezes sem darmos conta é o que falta, aquele pormenor que não sabemos o que é.  Eu pago esse serviço: https://wiredmasters.co.uk/. Não sou profissional da área, ainda estou a aprender e a pouco e pouco é algo que se vai encaixando no ouvido, pois também tem a ver com o gosto de cada um. 

Sei que é um entrave para muita gente, porque são preços que não são acessíveis a todos, e por isso é aconselhável que o investimento seja numa música que valha a pena, porque como disse há pouco faz toda a diferença.

Gostava mesmo muito que este texto ajudasse a malta, isto é só a minha opinião. Não fiz nem mais nem menos que outros artistas, eu trabalho assim e estou a partilhar alguns dos meus métodos com vocês. Todos os erros de que falei acima eu já os cometi. Não me arrependo de forma alguma, serviram para aprender e a acreditar cada vez mais na minha música. Todos os dias trabalho nisto porque acredito. Espero que vocês partilhem este pensamento. Assim será muito mais fácil que nós, amantes de música, tenhamos um maior sucesso e que levemos o nosso país fantástico além-fronteiras pelo que mais gostamos de fazer.
 
Zinko
Publicado em Zinko
domingo, 16 setembro 2018 22:47

Os "ginastas" da Dance Scene

O motivo da minha crónica deste mês vem na sequência de um post de um DJ que li há alguns dias numa das suas redes sociais em que dizia "isto é o que eu faço quando me pedem para tocar EDM" e fazia um gesto com a mão e o dedo do meio erguido dizendo também no mesmo post "I'm a Techno addict!". Como eu tinha a noção que o dito DJ tinha produzido há relativamente pouco tempo temas originais/remixes de EDM que tinha visto à venda no Beatport e que até tinha uma agenda internacional preenchida, fui um pouco atrás na sua rede social e realmente estavam lá os posts relativos a "great EDM Remix", vídeos no estúdio "what a EDM BOMB!", fotos com alguns dos artistas EDM do momento, etc. E fiquei realmente um pouco confuso...
 
O motivo da minha surpresa não é o facto de o DJ em questão ter mudado de estilo. Acho isso perfeitamente normal e faz parte do nosso percurso, quer como artistas, quer como pessoas. O que me faz muita confusão é como certos artistas podem, num momento querer ser os maiores num determinado estilo musical, porque está na moda e quando este deixa de estar na moda já é uma porcaria, já "passou o seu tempo" ou "isto é o que eu faço quando me pedem para tocar...". Essa parte já não entendo. Se até há pouco tempo querias ser o "novo príncipe do EDM", não podes, passado um ano e meio, dois anos, dizer que "isto é o que eu faço quando me pedem para tocar EDM" com um gesto obsceno. Até porque hoje em dia temos a internet que regista tudo o que publicamos, para sempre. E se vais publicar que és um "techno addict" e que "EDM sucks", ao menos apaga os posts anteriores onde dizes que estás a produzir a próxima "bomba EDM" ou que "respiras EDM". É o mínimo que se pode fazer em nome da coerência.
 
Entendo que seja o estilo musical mais "underground" que está na moda, mas ver alguns artistas (e muitas pessoas) que até à bem pouco tempo diziam mal do techno em favor de outros estilos (não só EDM) que agora são "techno addicts" faz-me alguma confusão. 

É verdade que o techno está na moda há já alguns anos e que parece que assim se vai manter durante algum tempo. Obviamente que não tenho nada contra isso até porque toco alguns temas techno nos meus sets, apesar de não ser um DJ cuja base seja esse estilo. Gosto de alguns dos temas que saem neste momento, embora já não seja tão fã da "nova" moda do techno mais rápido (para cima de 130/132 BPMs) que é bastante popular neste momento e que projectou vários DJs para a ribalta nos últimos tempos. Talvez porque, embora para a malta mais jovem seja uma sonoridade nova, alguns dos temas que estão na moda aos meus ouvidos soam-me ao techno que se tocava nos anos 90, inícios de 2000 com alguns sons novos, mas cuja base é bastante parecida e por isso não me soa a "novidade". Mas o certo é que há milhares de pessoas que seguem esse estilo e que enchem pavilhões, clubs, eventos e que para eles é uma sonoridade totalmente nova, coisa que entendo perfeitamente e que respeito totalmente. 

Mas será mesmo necessário que de repente quase toda a gente "viva para o techno", "respire techno" e seja "techno fanatic"? Entendo que seja o estilo musical mais "underground" que está na moda, mas ver alguns artistas (e muitas pessoas) que até à bem pouco tempo diziam mal do techno em favor de outros estilos (não só EDM) que agora são "techno addicts" faz-me alguma confusão. 

Tal como disse antes, obviamente que não tenho nada contra os artistas que mudam de estilo musical, isso faz parte do percurso de vida, da evolução pessoal de cada um, e é uma situação perfeitamente normal. O que me faz confusão é o aproveitamento de alguns em "mudar" para o estilo que está na moda dizendo mal do estilo que lhes deu muito dinheiro a ganhar. Quer publicamente quer em privado. Os Ingleses têm uma expressão para isso, chamam-lhe "jump on the bandwagon".

PS: Recentemente o DJ e produtor de EDM Hardwell comunicou que ia fazer uma pausa nos seus gigs por tempo indefinido para se dedicar a ser "Robbert e deixar de ser Hardwell 24 horas por dia" devido à pressão que isso significava na sua vida pessoal e ao efeito que estava a ter sobre a sua criatividade como artista. O que me levou a ler mais uma vez a crónica anterior que escrevi para a 100% DJ sobre o falecimento de Avicii. A vida de um DJ de topo com uma agenda internacional como Avicii ou Hardwell tinham, não é nada fácil. Felizmente Hardwell percebeu onde estava o seu limite e conseguiu parar a tempo...
 
Carlos Manaça
DJ e Produtor
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
quarta, 03 junho 2020 23:04

(Des)governados

Atravessamos momentos únicos da nossa vida e ninguém consegue fazer futurologia. Estamos completamente desgovernados por tudo, por todos e também por nossa culpa por não sabermos antecipar problemas.

Apesar de tudo, há algo que sempre iremos conseguir fazer - adaptação aos novos desafios. 

Existem DJs desde o tempo em que a tecnologia permitiu que uma única pessoa conseguisse "tocar musica gravada" (excluindo o aparecimento das grafonolas) e sempre houve adaptações e mudanças.

Provavelmente, nunca terá havido tantos recursos tecnológicos que permitissem adaptações como existem nos dias de hoje e cabe a cada um de nós pensar e implementar essas adaptações.
 
É certo que todos estamos desgovernados e até desesperados porque a principal fonte de rendimentos de um DJ é por norma as suas actuações e não havendo eventos ou espaços físicos com público para o fazer, as alternativas são escassas. O streaming é a opção lógica mas jamais poderá trazer a rentabilidade, o sentimento, a "magia" das actuações em "contacto" com o público, no entanto não nos podemos esquecer que num passado recente, muitos DJs usavam a rádio para ganhar a notoriedade que têm nos dias de hoje e as diferenças para um streaming são apenas em termos de imagem e suporte em que são transmitidas. 
 

Não tenho a pretensão de imaginar ou prever o futuro deste sector mas tenho a certeza que servirá como triagem para muitos amadores e profissionais ficarem pelo caminho (…)


Não tenho a pretensão de imaginar ou prever o futuro deste sector mas tenho a certeza que servirá como triagem para muitos amadores e profissionais ficarem pelo caminho, deixando a quem tenha perseverança um caminho aberto para o futuro quando esse mesmo futuro voltar a permitir o regresso dos DJs ao seu habitat natural. 

Sim, estamos desgovernados (todo o sector e não apenas os DJs) mas não existem soluções no imediato. 

Nada será como foi e com maior ou menos adaptação, maiores ou menores mudanças, o DJ pode estar "infetado" mas não irá "morrer".
 
Ricardo Silva
DWM Management
Publicado em Ricardo Silva
Existe um filósofo francês chamado Paul Virilio que defende que, na sociedade actual, é a velocidade o que define os vencedores e os líderes. Nas palavras dele: “a velocidade da luz já não transforma o mundo, a velocidade da luz é hoje o mundo”. Nada mais correcto. A meu ver, a velocidade é hoje a força motriz de qualquer pessoa. Todos estabelecemos prazos - cada vez mais curtos - para alcançar objectivos e encaramos como falhanço se não os alcançarmos. A nossa sociedade hoje funciona assim. É refém da velocidade. Fazer bem é fazer rápido.
 
É certo que este é o mundo em que vivemos. Se olharmos para o que nos rodeia percebemos facilmente que as músicas se tornam facilmente epifenómenos. Basta pensar que há não muitos anos atrás, hits mundiais das pistas de dança subsistiam no tempo e, hoje em dia, é bastante improvável apanhar os hits de 2013 ou 2014 em 2015. Nos próprios radioshows dos top DJ’s da actualidade há uma quase obsessão com a novidade e a exclusividade. É mesmo difícil em grande parte deles encontrar “músicas já editadas”, quase como se as músicas por já terem sido editadas ultrapassassem o prazo.
 
Este, a meu ver é um dos principais problemas da nova geração de produtores e DJ’s que surgiu nos últimos dois / três anos. É obcecada com a velocidade. Quer, a todo o custo, fazer rápido. Mas atenção que fazer rápido não significa fazer bem. Mas o erro não está em querer fazer rápido. O erro está em só querer fazer rápido, ou, de outra forma, só admitir como sucesso fazer rápido.
 
A verdade é que o insucesso gera frustração. E, em grande parte das vezes, o insucesso e a frustração são nada mais que sinónimos de impaciência. Todos olham para fenómenos como Martin Garrix ou Madeon e pensam “também quero ser um prodígio de 16 ou 17 anos, cheio de sucesso”. Mas esquecem-se que estamos a falar em primeiro lugar de artistas com uma estrutura profissional gigantesca e em segundo lugar de artistas que, apesar da juventude, já cá andam há alguns aninhos. 
 

O talento só não é premiado quando os talentosos desistem. Parece um cliché, mas é assim que a vida funciona.

 
Por isso quando se sentirem frustrados, ou a achar que vivem num mundo cruel em que só não têm sucesso porque “o público não tem cultura”, “nenhuma agência aposta em mim”, “não tenho um bom estúdio”, “não tenho dinheiro para investir”, “nasci no país errado”, pensem que grande parte dos top DJ’s da actualidade, tirando poucas excepções, construiu uma carreira ao longo de 5, 10 ou 15 anos antes de chegar ao topo. É como em tudo, nenhum recém-licenciado começa a trabalhar como Director numa multinacional. Se for um prodígio, trabalhar e fizer tudo bem, certamente lá chegará. E sim, em Portugal como em tudo, as coisas obviamente demoram um bocadinho mais.
 
Não estou a dizer para serem passivos ou abrandarem o ritmo. Nada disso. Apenas que precisam de conviver com o tempo, tendo sempre em mente que o talento é sempre premiado. Mais tarde ou mais cedo. Pode tardar, mas é quase uma inevitabilidade. O talento só não é premiado quando os talentosos desistem. Parece um cliché, mas é assim que a vida funciona. É como diz o ditado: “Roma não se fez num dia”.
 
Hugo Rizzo
Publicado em Hugo Rizzo
segunda, 06 julho 2020 23:28

Ajuntamentos ou locais controlados?

No início de Março, quando foi publicada a minha ultima crónica para a 100% DJ, tive que escrever duas crónicas porque a primeira que enviei ficou desactualizada em dois dias. Hoje, ao ler a última que escrevi, vejo que a realidade ultrapassou tudo o que eu tinha imaginado (e escrito) nessa altura, quando acabava de ter o meu primeiro evento adiado/cancelado. O que o sector ligado à música está a viver desde essa altura, jamais me passou pela cabeça. Desde essa altura que estamos com todas as nossas actuações canceladas e sem sequer haver um plano/data de uma possível volta ao trabalho de todo um sector.

O facto de não haver sequer um plano para todo um sector que até parou, por uma responsável decisão própria, antes de ser obrigado a isso pelo governo, na minha opinião é uma situação difícil de entender. Ouvir o tom depreciativo com que o primeiro-ministro falou de todo um colectivo foi um choque para mim e certamente para todos os empresários ligados a este sector, nas suas varias vertentes. 

Ouvir o tom depreciativo com que o primeiro-ministro falou de todo um colectivo foi um choque para mim e certamente para todos os empresários ligados a este sector, nas suas varias vertentes.

 
É verdade que este vírus colocou à prova os governos de praticamente todos os países, muitas decisões foram tomadas segundo o que ia acontecendo porque não se conheciam (e ainda não se conhecem bem) todas as características deste novo coronavírus. Numa primeira fase e segundo alguns especialistas, Portugal foi um exemplo internacional porque foi dos primeiros a limitar fortemente a mobilidade das pessoas e com isso limitar muito as possibilidades de contágio. É verdade que, comparativamente com os países vizinhos, Portugal tem um número de falecidos muito menor devido a esse sucesso na primeira fase desta pandemia e que os cuidados intensivos dos hospitais Portugueses (felizmente) nunca estiveram em rotura tal como aconteceu aqui em Espanha, situação que provocou muitos mortos pela incapacidade de serem atendidos nas urgências.

Infelizmente estamos a assistir nos últimos tempos a um aumento dos contágios confirmados em Portugal, situação que seria expectável uma vez que há uma maior mobilidade das pessoas, há mais gente a trabalhar e a deslocar-se em transportes públicos, a ir a centros comerciais, a supermercados. Basicamente há muito mais gente nas ruas que antes. Mas infelizmente também estamos a assistir à irresponsabilidade de algumas pessoas que se juntam sem terem qualquer cuidado, seja usando máscara, seja mantendo a distância de segurança aconselhada. Uma grande parte dessas pessoas são jovens que depois de estarem fechados em casa durante mais de dois meses se juntam com os amigos em grandes grupos sem cumprirem as normas mínimas de segurança, porque na realidade, não têm qualquer opção para o fazer de uma forma mais controlada.

A pergunta que coloco neste artigo é, na minha opinião, lógica: não seria melhor darem a esses jovens alternativas onde se pudessem juntar, de forma minimamente controlada, e assim reduzir esses ajuntamentos onde quase ninguém cumpre as normas de segurança?

Li em muitos comentários nas redes sociais que é "totalmente impossível manter a distância social numa discoteca, num bar, assim como ter os cuidados necessários à não propagação do vírus". Aliás, ouvimos o próprio primeiro-ministro dizer isso em directo, na TV.

Na minha opinião, depende muito das características dos espaços em questão. Obviamente há muitos locais em que é praticamente impossível criar condições mínimas de segurança por serem totalmente fechados, pouco amplos, com acessos interiores difíceis e com pouco espaço para as pessoas estarem mais afastadas e que não têm condições para abrir neste momento. Entendo isso e acho que qualquer empresário responsável que tenha um espaço com estas características, sabe que abrir nestas condições iria quase de certeza criar problemas.

Mas há muitos outros que têm características que lhes permitiria abrir com as mesmas condições já existentes para outro tipo de actividades. No Algarve, por exemplo, há muitos locais ao ar livre que podiam, com restrições de capacidade e com o uso de máscaras e gel desinfectante, abrir as portas. No resto do país também há alguns locais desse tipo, que poderiam abrir com as mesmas condicionantes de segurança.

Obviamente numa primeira fase não se poderia funcionar em horário completo, mas pelo menos esses espaços que têm uma grande parte ou são totalmente ao ar livre deveriam poder abrir. Ou pelo menos, tentar abrir. 

O que acontece é que, por terem o código de actividade de "discotecas" ou "bares", mesmo tendo estas características, não lhes é permitido abrir, numa decisão, na minha opinião, difícil de entender, especialmente quando vemos outro tipo de eventos com grandes ajuntamentos de pessoas, a serem "autorizados" ou pelo menos permitidos pelas autoridades, alguns deles por motivos políticos.
 

Não seria melhor darem a esses jovens alternativas onde se pudessem juntar, de forma minimamente controlada, e assim reduzir esses ajuntamentos onde quase ninguém cumpre as normas de segurança?

 
Pelo que sabemos até agora e do pouco que parece já assumido pela comunidade científica sobre este novo coronavírus, um dos seus principais focos de transmissão (senão o principal) são as aglomerações de muitas pessoas. Sejam elas por que motivo forem. Partidárias, futebol, religião, "botellon", praia, música, todas podem ser um foco de transmissão, todas podem contagiar se não forem tomadas precauções. 
Os ajuntamentos para ouvir música numa esplanada, num bar ao ar livre, numa discoteca ao ar livre, não são mais contagiosos do que os ajuntamentos autorizados numa manifestação política, como nos querem fazer crer.

Acho que seria importante nesta altura estabelecer de uma vez por todas regras claras e realizáveis para, lentamente, com capacidade limitada e com muitos cuidados, se começarem a abrir alguns dos locais com características especificas, regras que já existem para outras actividades. Certamente iria dar aos jovens uma alternativa mais controlada do que os ajuntamentos para os "botellons" que têm feito um pouco por todo o país.

Os empresários destes locais deram uma lição de responsabilidade a muita gente no inicio de todo esta pandemia quando decidiram fechar, mesmo antes de serem obrigados a isso. Pensaram na saúde de todos à custa da sua própria fonte de rendimento. Acho que mereciam um outro tratamento pelas autoridades responsáveis...
 
Carlos Manaça
DJ e Produtor
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
segunda, 16 maio 2022 15:10

Para onde caminha a Noite...

À medida que a pandemia parece estar cada vez mais para trás, a necessidade de capitalização das empresas sobrepõe-se a tudo o resto. Cada vez mais reparo que não interessa muito o que se passa dentro do clube, desde que o mesmo esteja cheio. É pena este tipo de mentalidade, pode parecer estranho, mas acho mesmo que perdemos uma excelente oportunidade para mudar o paradigma da noite no nosso país. Durante a pandemia dei por mim várias vezes a pensar que no meio de tudo o que de mal nos estava a acontecer, pelo menos uma coisa boa seria o facto de todos podermos fazer uma auto-análise que nos permitiria ver como estávamos e víamos as coisas e de que forma as poderíamos alterar. Não resultou...

Independentemente dos gostos musicais de cada um, que podem ser próprios ou por imposição de uma máquina comercial completamente desprovida de consciência, a população mais jovem vai-se perdendo num vazio musical e pessoal onde o que conta é a aparência e a irreverência, seja lá isso o que for para eles. Claro que se pensarmos nisto numa forma mais profunda, por muito que custe ouvir, a culpa começa em casa, como é óbvio, mas para não me desviar do propósito desta crónica, é realmente assustador tentar perceber por onde andará a música dita "comercial" nos próximos tempos, se tomarmos em linha de consideração o que se está a passar agora.

Pelo caminho que as coisas estão a tomar, é óbvio que, salvo raras exceções, cada vez iremos ver menos deejays convidados a pisar as nossas cabines, ou pelo menos nacionais, uma vez que se é para se ser irreverente e cool, que seja em grande, por isso tem que ser internacional, para assim seguir a tendência do mercado. Se queremos ter um público cool e irreverente, temos que os educar dessa forma. Ao menos vejo aqui alguma coerência, há que admiti-lo!

O grande problema actual para qualquer artista nacional com personalidade e identidade musical é que se analisarmos friamente isto tudo com uma perspectiva única e exclusivamente virada para o imediato, obviamente que não faz sentido, do ponto de vista empresarial, estar a contratar um deejay com vontade própria por uma razão muito simples. Se o objetivo é injetar dinheiro na empresa, porquê estar a pagar muito dinheiro, quando praticamente pelo mesmo que se paga a um profissional de segurança podemos ter uma noite absolutamente garantida e não correr riscos? É óbvio que este tipo de pensamento, numa primeira análise rápida, nos faz elogiar os dotes empresariais de qualquer gerente de espaços nocturnos.
Mas infelizmente o que não estamos a conseguir perceber são as consequências que tudo isto vai causar na noite em termos futuros, no seu ambiente, na sua segurança, na forma como todos os profissionais da noite vão poder fazer o seu trabalho, em resumo, na essência da noite.

Na música, muitas vezes ouvi dizer que enquanto o artista mandava na indústria, as coisas iam fluindo. A humanidade artística e a singularidade humana dos mesmos mantinha tudo arrumado nos seus sítios. o problema foi quando a indústria começou a mandar no artista. Uma indústria que não olha a meios para atingir objectivos, que não tem sentimentos, qualquer tipo de amor ou criatividade para dar, uma indústria que apenas vê uma coisa, números. Da mesma forma, também a noite sempre ditou as regras nos clientes, regras essas que eram invioláveis, e que faziam com que a noite fosse especial, com uma mística e um mistério associados até a um ligeiro medo por quebrar certas barreiras, o que de uma forma muito lógica, mantinha o equilíbrio.
 
Mas o tempo passou, e as mentalidades mudaram. Infelizmente parece-me que também na oferta nocturna os papéis se inverteram. Os clientes passaram a mandar na noite. Vamos ver como vai correr... Ou muito me engano ou provavelmente num futuro próximo os protagonistas da noite mais bem remunerados terão que ser mesmo os seguranças, e com muita tristeza digo que uma noite sem segurança, visão de futuro e uma forma de estar comandada de dentro para fora não me parece muito próspera. Espero estar enganado.
 
DJ & Produtor
Publicado em Carlos Vargas
segunda, 05 março 2018 21:25

Num Mundo de Lobby's

No mundo do negócio, seja qual for a arte existe sempre a tendência às ajudas e aos conhecimentos entre entidades que tendem em favorecer quem por norma com as mesmas trabalha ou priva.

Este é um assunto bastante sensível e delicado, sendo que centralizando a questão, no meio da electrónica, deparamo-nos sempre com a questão do talento vs conhecimentos. Existe a necessidade de ter uma estratégia a longo prazo e no entanto estar sempre atento às oportunidades que possam surgir no intuito de fazer as melhores escolhas para uma carreira consistente. É preciso encarar a construção de uma carreira musical como jogar uma lotaria ou entregar a sorte ao destino, assim como dizer tenho um amor ou um dom, mas de verdade quem decide é a indústria e todos os que apoiam e seguem o meu trabalho. 

No meu caso em específico e ao longo da minha carreira sempre me fui deparando com algumas situações e entidades que me ajudaram, mas também com outras tantas que me fizeram trabalhar ainda mais e criar projectos que me ajudassem a depender apenas das minhas ideias e do trabalho artístico que tinha e tenho traçado como objetivo a alcançar. 

Não obstante tudo o que já mencionei é não menos importante referir que apesar de todo apoio que tenho e tive (do qual estou infinitamente grata), sempre foi o facto de eu fazer aquilo que mais gosto que de certa forma ajudou a ter uma carreira sólida. Basicamente por mais que sejam as "ajudas" e conhecimentos, se todas as vezes que que subo a uma cabine o trabalho não for bem feito, não existe nenhum "lobby" que ajude a longo prazo. 
Esta é a verdadeira realidade e resumo da questão, acreditar no que faço, fazê-lo com paixão sempre com o intuito de inovar e agradar todos aqueles que me seguem, porque são esses a quem eu agradeço e devo o sucesso da minha carreira como artista. Trabalhar bastante, ser optimista e humilde são os antídotos para a questão desta minha opinião.

Acontecem várias vezes e pessoalmente conheço inúmeros talentos, estes infelizmente por não conhecerem alguém ou uma plataforma que os ajude a mostrar o trabalho acabam por ficar no anonimato ou desistir, o que é lamentável. Eu como proprietária de uma editora e com a curadoria de alguns projectos faço tudo ao meu alcance para que estas situações não aconteçam, como apostar em novos talentos, contudo nem sempre é o suficiente. Mas por outro lado acredito que com persistência e a dedicação tudo é possível.
Publicado em Miss Sheila
E aqui estamos nós, quase um ano e meio depois. É realmente uma prova de fogo esta pela qual nos estão a fazer passar. Milhares de live streamings nas redes sociais a custo zero depois, a vida e futuro dos DJs e de todos os que estão ligados ao setor nocturno permanece uma verdadeira incógnita. 

Cada vez mais uma incerteza, esta profissão tende em se manter viva à conta de todo um novo circuito, constituído por restaurantes e esplanadas dos mesmos, a fazer o nosso trabalho por aquilo que nos quiserem dar. Se antes já não era uma forma de sustento fácil, agora acabamos por ficar entregues nas mãos de um sector que obviamente não tem o mesmo grau de profissionalismo que permitiria a este sector artístico a dignidade mínima para poder exercer o seu trabalho, mas que neste momento tem a faca e o queijo na mão. A realidade é que dou por mim a não querer pensar muito naquilo que poderá vir a ser o futuro da minha profissão, pelo simples facto de não saber se existirá um. 

Completamente ignorados por quem governa e toma decisões no nosso país, acaba por ser frustrante olhar para trás e relembrar todo o passado recente, que envolveu sacrifícios e muito trabalho, mas que no presente não serve absolutamente para nada. Cada vez mais parece que o desejo de quem toma as decisões é passar a designar como restauração apenas os restaurantes, os grandes beneficiados com esta pandemia, uma vez que parecem ser, cada vez mais, os grandes meninos queridos do Governo. 

Pintados como os bichos papões de tudo o que de mal acontece neste país, mesmo sendo os únicos que se encontram encerrados desde o início de todo este enredo, sim, porque o insulto que nos fizeram, ao equipararem os bares e discotecas a meros cafés como forma de podermos trabalhar sem condições nenhumas para a nossa área vai ficar para a história, os bares e discotecas continuam a ser objecto de uma tentativa de aniquilação colectiva sem precedentes num estado de direito, sendo que a única coisa que podemos fazer é assistir de uma forma quase tortuosa, à destruição do trabalho de milhares de pessoas, sejam elas artistas, proprietários, profissionais de bar ou seguranças, entre muitos outros. 

A perseguição das forças policiais, com ameaças de autos de contra-ordenação  e discursos agressivos como se estivessem a falar com criminosos, apenas uma mão cheia de minutos depois do horário "permitido" por lei, torna-se não só insultuoso, mas cada vez mais revoltante, fazendo-nos sentir como marginais, mas daqueles que pagam as suas contas, impostos, seguranças sociais e todas as suas obrigações como qualquer português, tirando os da elite, é claro. 

É com muita tristeza que vejo que temos um Governo que não percebe que ao fecharmos o nosso sector em Março de 2020, o fizemos em prol da saúde pública, para bem de todos os portugueses, perdendo com isso milhares e milhares de Euros, perdendo basicamente a nossa independência financeira. Sim, nós fizemos um favor ao país, esta é a verdade! Semana após semana apenas a esperança nos vai mantendo lúcidos o suficiente, para podermos apenas continuar a ter mais esperança, enquanto assistimos a uma Europa toda a devolver a vida aos nossos colegas de sector. Ainda bem para eles, nada de confusões, mas é decepcionante perceberes que estás num país que não sabe reconhecer todos os sacrifícios que foram feitos por ele.

Assistimos a eventos políticos, privados e para a Europa ver onde tudo lhes é permitido, enquanto o nosso sector tem que permanecer quieto e sem se poder queixar muito. Muito sinceramente custa-me um pouco a perceber o porquê desta discriminação e autêntica indiferença, nenhum outro sector passou por semelhante situação na nossa sociedade. À hora que escrevo este texto, já nem me consigo lembrar da última vez que passei música, nem sei se alguma vez voltarei a passar, mas aquilo que sei com toda a certeza é que agora compreendo um pouco melhor tudo o que o meu avô me contava acerca dos tempos da ditadura em Portugal. A pior coisa que, como seres humanos podemos sentir, é realmente sentirmo-nos ostracizados, marginalizados e absolutamente condicionados naquilo que são os nossos direitos básicos como seres humanos. 

É triste olhar para este belo país que é Portugal e vê-lo tão feio, tão descolorido e mau. Enfim, ainda temos a nossa esperança, a esperança que um dia iremos acordar e todo este pesadelo terá desaparecido... ou não!
 
Publicado em Carlos Vargas
terça, 15 dezembro 2020 22:17

Pensar o futuro

Se tivesse de escrever sobre o que se passou este ano na Cultura e mais concretamente nos Djs e/ou na música electrónica, certamente 2 linhas seriam suficientes ou até mesmo um "texto em branco".

O ano de 2020 ainda não terminou e apesar de estarmos quase a entrar em 2021, tudo indica que iremos permanecer em 2020 até ao Verão (para ser optimista). 

Depressivos e apreensivos já todos nós estamos, pelo que resolvi partilhar convosco "um olhar sobre o futuro" e deixar-vos algumas informações do que se está a fazer, pensar e planear para os DJs Portugueses. 

Recentemente (Setembro de 2020) foi criada uma Associação sem fins lucrativos que juntou várias pessoas do sector e que dá pelo nome de "Associação Portuguesa do Entretenimento" que engloba também os DJS e produtores (consultem www.apent.pt).

Esta Associação não tem qualquer valor de inscrição como associado, não cobra qualquer quotização (em virtude da actual ausência de actividade do sector) e não recebeu qualquer apoio financeiro, sendo totalmente suportada pelas verbas e trabalho dos sócios fundadores. Em Janeiro irá ter um espaço físico (sede) para que possa iniciar o seu trabalho social e com espírito de missão onde um dos principais "problemas" para resolver está relacionado com os DJs. 

Os DJs sempre "reclamaram" por não serem ouvidos, reconhecidos como profissão e serem devidamente regulados, mesmo havendo associações específicas mas que pouco ou nada fizeram ou podem fazer devido à sua natureza juridica, falta de representatividade ou interesses próprios. Com esta nova Associação, devidamente enquadrada, legalizada e estruturada, há finalmente condições para "pensar o futuro". 

Os estatutos dão total autonomia aos associados e é deles a associação e não de uma pessoa singular ou um grupo de pessoas, o que permite que TODOS tomem iniciativa e apresentem ideias, projectos e "exigências" que sejam levadas junto das entidades competentes para que haja uma regulamentação, reconhecimento da profissão e principalmente um olhar sobre a importância do papel que o DJ desempenha na Cultura Portuguesa. 

Todos aqueles que agora estão a passar dificuldades, não têm qualquer tipo de apoio, não podem desenvolver projectos, partilhar o seu trabalho por falta de meios físicos e equipamentos, ter perspectivas de futuro, expôr as suas ideias, etc., não terão mais desculpas porque cada associado é "dono" da associação e terá os mesmos direitos (e deveres) que os restantes associados. 

Os tempos estão difíceis e nada podemos fazer sem ser "pensar o futuro" e está nas mãos de cada um de nós, alterar, precaver e melhorar o futuro de todos nós. 

Os meus votos de Boas Festas (na medida do possível) para todos e aproveito para parabenizar o portal 100% DJ por mais um aniversário ao serviço da divulgação e promoção do melhor que fazemos em Portugal nesta área específica que necessita mais que nunca de ser apoiada.
 
Ricardo Silva
DWM Management
Publicado em Ricardo Silva
 
Não me identifico com a grande maioria da música produzida por David Guetta, sobretudo porque desprezo o caráter industrial que as suas produções assumiram. São músicas produzidas em série, num estúdio que mais parece uma fábrica "fordista", que visam apenas conservar, a todo o custo, a sua notoriedade, numa indústria cada vez mais efémera e em que a música assume um relevo cada vez menor, sendo apenas uma das muitas variáveis em jogo. Há muitos anos que a música vazia de David Guetta, pura e simplesmente, não me toca.
 
Dito isto, e pondo os gostos de parte, fico sempre incrédulo quando vejo os inúmeros boatos que sobre ele circulam na Internet. O último li-o no Wunderground, um portal irlandês dedicado à arte e música underground, carregado de mexericos e artigos falsos que apenas servem para ridicularizar alguns artistas e capitalizar leitores rancorosos - para os mais incautos, foi deste mesmo portal que saiu a notícia, também falsa, de que Axwell se iria retirar da indústria musical.
 
Estes artigos teriam piada se os leitores percebessem claramente de que se trata de escrita humorística - como acontece, por exemplo, com o Inimigo Público. O problema é que, ao incluir a informação verdadeira e falsa no mesmo saco, o Wunderground gera a confusão e induz os leitores em erro. Para além de o artigo ser uma sátira evidente, repleto de episódios inverosímeis e caricaturais, faz uma alusão a um post no Twitter de Guetta que nunca existiu.
 
Mas o que mais me espantou nesta história, e que acabou por ser a principal razão por que se multiplicaram os sites que mencionaram o assunto, foi o facto de Frankie Knuckles e David Morales, pioneiros do House e referências incontornáveis dos primeiros produtores de música eletrónica portuguesa - entre os quais eu me incluo -, terem contribuído para amplificar o equívoco, ao comentarem, no site da rádio online americana Coco.fm, um artigo falso como se fosse verdadeiro. Aquilo que não passava de um artigo satírico passou a ser visto como notícia.
 
Conclusão: passadas algumas horas, dezenas de sites referiam a polémica e milhares de pessoas em todo o mundo prontificavam-se a crucificar Guetta, com comentários que exalavam ódio e ressentimento. Porquê? Sobretudo, porque, influenciados por uma campanha na Web que visa ridicularizá-lo, não gostam da música que ele passa e produz. Não querendo fazer de advogado do diabo, posso dizer que já o vi a pôr música antes de ele ter atingido o estatuto que hoje tem e, apesar de não ser a minha praia musical, até o achei eficaz e competente. Alguns colegas meus dizem o mesmo. Para mim, a qualidade de um DJ não é medida pelo estilo de música que ele toca.
 

Às vezes, sinto-me numa cena em que estamos todos à espera da machadada final, uma espécie de "Dance Music Sucks" (...)

Não gostar de David Guetta, é uma coisa; enxovalhá-lo e linchá-lo publicamente, utilizando o boato como modus operandi, é outra muito diferente. Os fins não justificam os meios. No final do dia, é toda a música de dança que perde, que fica cada vez mais dividida e, por isso mesmo, enfraquecida. Às vezes, sinto-me numa cena em que estamos todos à espera da machadada final, uma espécie de "Dance Music Sucks", num remake do conhecido episódio protagonizado por Steve Dahl que simbolizou o fim da era Disco.
 
Para além de ter tornado patente a crispação e a divisão que hoje existem entre duas diferentes correntes de música de dança, uma mais underground e outra mais mainstream, este episódio serve para nos relembrar de que é necessário sermos especialmente prudentes quando lemos online. Se nem tudo o que aparece em revistas e jornais é verdadeiro, imagine-se na Internet, que não passa pelo crivo jornalístico ou de gente preparada para rever o material publicado.
 
"Como disse o antigo primeiro-ministro britânico James Callaghan, 'uma mentira pode dar a volta ao mundo antes de a verdade conseguir calçar as botas'. Nunca tal foi tão verdade quanto com a acelerada, destravada e desgarrada cultura da blogosfera da atualidade"1.
 
1Andrew Keen, O Culto do Amadorismo
 
Alex Santos
Publicado em Alex Santos
Pág. 10 de 13

Newsletter

Recebe novidades e conteúdos exclusivos no teu e-mail.