Diretor Ivo Moreira  \  Periodicidade Mensal
É com bastante satisfação que vejo que este ano, ainda mais do que nos anos anteriores, Portugal faz parte da agenda de muitos “top“ DJ’s Internacionais, de diferentes áreas musicais. Portugal está na moda e isso reflecte-se no turismo e nos eventos que acontecem todos os fins-de-semana, especialmente nesta altura, de Norte a Sul do país. É muito bom ver eventos praticamente esgotados, à tarde, à noite, fim-de-semana após fim-de-semana (e muitos dias de semana...), com artistas que participam nos melhores festivais de música electrónica pelo mundo fora. Depois de passarmos por um período “negro” economicamente que se reflectiu na quantidade (e qualidade) de eventos que tivemos, é com muita satisfação que vejo os cartazes dos eventos recheados de grandes nomes provenientes das várias áreas da música electrónica. Eu vou participar em alguns desses eventos, e nos que já aconteceram, como por exemplo o Sound Waves do passado dia 29 de Julho em Esmoriz, a afluência de pessoas foi superior à dos últimos anos.
 
Voltámos a ser “A Paradise Called Portugal”. Quem já anda dentro da “dance scene” portuguesa há alguns anos certamente se lembra desta frase, muito repetida pelas revistas lá fora depois de ter sido o título de uma reportagem da revista Inglesa Muzik em 1995. Nos anos 90, as revistas eram o principal meio divulgador da “dance scene” a nível internacional (ainda não tinha chegado a internet...) e nessa altura a DJ Mag, Mixmag e a Muzik eram três das principais revistas inglesas totalmente dedicadas à música electrónica. A meio da década dos 90, as três mandaram várias vezes repórteres a Portugal para cobrirem a vibrante vida nocturna nacional, chegando mesmo a dizer que “Portugal é a nova Ibiza”. Começou a haver uma programação regular de grandes artistas internacionais, quer em clubs quer em eventos, e Portugal começou a aparecer, pela primeira vez, na agenda dos grandes DJ’s internacionais. Já tinham acontecido alguns eventos pontuais com artistas internacionais de topo (lembro-me do evento no Castelo de Santa Maria da Feira em 1992, com Danny Tenaglia e Jaydee entre outros artistas, como um dos mais importantes) mas não havia ainda uma programação regular de eventos, quer em clubs quer como produções independentes, com DJ’s que fizessem parte do circuito internacional.
 

(…) todos me diziam que o nosso país era fantástico e que não entendiam como sendo tão pequenos em dimensão, tínhamos uma vida nocturna tão vibrante (…)



 Com as reportagens das revistas Muzik, DJ Mag e Mixmag (entre outras), Portugal começou a estar no “mapa” dos principais DJ’s e houve um “boom” de eventos com cartazes ainda hoje impressionantes se considerarmos a dimensão do nosso país. Foi a partir dessa altura que ficaram famosas as semanas da Páscoa no Algarve onde todos os dias durante uma semana (às vezes até mais...) se podiam ouvir muitos dos DJ’s/Produtores mais importantes a nível internacional, quer na Locomia (no espaço onde hoje existe o Le Club, em Albufeira), quer na Kadoc, espaço que hoje se chama Lick Algarve, em Boliqueime, perto de Vilamoura. Além de todos esses eventos no Algarve durante o período da Páscoa, aconteciam também muitos eventos regulares no Pacha em Ofir e no Vaticano em Barcelos, entre muitos outros clubs. Foi um período dourado da “dance scene” em Portugal e onde o nosso país era referido muitas vezes na imprensa estrangeira especializada como um dos melhores locais da Europa para a “club scene”, com fantásticos clubs e um público com uma entrega e um gosto musical sem igual. Acompanhei muitos DJ’s estrangeiros quer enquanto residente no Rock’s em Vila Nova de Gaia, quer mais tarde quando fazia parte da produtora de eventos X-Club, e todos me diziam que o nosso país era fantástico e que não entendiam como sendo tão pequenos em dimensão, tínhamos uma vida nocturna tão vibrante e com tanta qualidade.

Infelizmente, e por vários motivos, esse período acabou de maneira repentina. Como a “dance scene” em Portugal atingiu uma dimensão considerável em termos de negócio, rapidamente começaram as disputas entre produtoras (e até DJ’s) para conseguir fazer o evento no club “Y”, tentando bloquear o artista “Z” à outra produtora para que não pudesse fazer um evento com esse “top” DJ. Foram muitas as situações a que assisti, de ambos os lados das principais produtoras dessa altura, para tentar bloquear datas, discotecas, artistas, etc. Obviamente isso não podia ter um desfecho feliz e o resultado foi que a rentabilidade dos grandes eventos foi sendo cada vez menor (até porque cada vez os cartazes eram maiores e mais caros...) e cada vez foi sendo mais difícil trazer pessoas a esses eventos. Obviamente também porque se esgotou um pouco o factor “novidade” dos primeiros anos e a crise que apareceu em 2000 (sim, já estávamos em crise nessa altura...) fez o resto. Deixámos de ser um paraíso para a música electrónica internacional e durante algum tempo poucos eram os eventos que contavam com artistas de topo a nível mundial.
 
20 anos depois do “Neptunus Music Festival”, evento que aconteceu nos dias 2 e 3 de Agosto de 1997 em Albufeira (no local onde agora é a Marina) e que para mim (e para muitos) colocou Portugal definitivamente no mapa dos grandes eventos de música electrónica a nível internacional, surge o BPM Portugal. Pela primeira vez, a produção de um dos maiores festivais de música electrónica do mundo (que engloba as labels e produtoras mais importantes a nível internacional) vai sair de Playa Del Carmen no México, depois de 10 edições e escolheu Portugal. Não foi por acaso. Portugal está mesmo na moda a nível internacional!
 

(…) só espero que não se cometam os mesmos erros que se cometeram no passado e que esta dinâmica dure muito mais do que durou antes, o nosso público merece!

 
O “Neptunus Music Festival” trouxe a Albufeira quase 40 dos “top” DJ’s internacionais da altura (lembro-me que o único que não pode vir na altura foi o Danny Tenaglia porque não tinha nenhum dos dias disponíveis) para atuarem em dois dias em quatro tendas em mais de 12 horas por dia, em cada tenda. Eu tive a honra de actuar em duas das tendas. Nunca tinha sido feito nada do género em Portugal até essa altura e foi um sucesso tremendo.
 
O BPM Portugal, 20 anos depois do “Neptunus Music Festival”, vai conseguir juntar muitas das maiores labels e produtoras de grandes eventos internacionais que vão trazer praticamente TODOS os grandes artistas ao Algarve, entre os dias 14 e 17 de Setembro, num evento que certamente vai marcar a “dance scene” em Portugal.

Vendo todo este “boom” de grandes eventos em Portugal, com grandes artistas, só espero que não se cometam os mesmos erros que se cometeram no passado e que esta dinâmica dure muito mais do que durou antes, o nosso público merece!
 
Carlos Manaça
DJ e Produtor
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
terça, 15 junho 2021 22:56

"Tudo Parece Perfeito"

Confesso que me foi extremamente difícil escrever esta crónica. O meu primeiro impulso foi escrever sobre a situação actual dos vários sectores ligados à música, aos eventos, às actuações ao vivo, mas tudo isso já foi comentado (e bem) pelos meus colegas cronistas.

O tema da minha crónica é outro. É sobre uma história de superação e motivação de um colega DJ que muito me (nos) tem ajudado a superar esta nova realidade que estamos a viver desde Março de 2020.

Desde que soube do estado de saúde do Magazino (para mim Costinha, a quem conheço há muitos anos) que temos estado mais em contacto do que aquilo que a nossa rotina anterior, com "gigs", permitia. 
E a verdade é que ele, apesar de todos os problemas de saúde que está a ter, é uma contínua motivação para mim e para muitos outros.

Mesmo passando por tudo aquilo que está a passar, ainda tem força para nos enviar mensagens de motivação no grupo de WhatsApp criado por ele para nos animar, para que nós, DJ’s e músicos que estamos sem trabalhar há 15 meses (!) não baixemos os braços, para que tenhamos paciência. Coisa que muitas vezes é difícil tal a incompetência e incoerência de quem nos governa...

Sua foi também a ideia de fazer o documentário "Tudo Parece Perfeito", com vários DJ’s e produtores Portugueses, de várias gerações, sobre aquelas histórias caricatas, dos bastidores, que aconteceram (e ainda acontecem) na nossa carreira, realizado e produzido pelo realizador Gonçalo Almeida.

No "teaser" que gravámos ouvi muitas histórias que prometem um grande documentário, com muitos episódios curiosos que vão mostrar que, no dia-a-dia de um DJ, muitas vezes o que parece uma vida de sonho, na realidade tem um outro lado que não é tão glamoroso e que é muito exigente.

Certamente que o Magazino tal como DJ Vibe, Rui Vargas, Moullinex, Gusta-vo, Yen SungDiana Oliveira e Violet têm imensas histórias para contar. São muitos anos de carreira, muitas horas de música, muitos "gigs", que certamente originaram muitas histórias que merecem ser conhecidas. Histórias essas que vão mostrar esse outro lado da nossa profissão e de certeza fazer-nos rir.

Eu já comecei a escrever e a compilar alguns dos meus episódios mais caricatos para a gravação final e posso garantir que tenho muitas histórias para contar, desde o início da minha carreira profissional, em 1986. Nestes 35 anos houve muitos e bons episódios que nunca vieram a público e que vou partilhar convosco neste documentário.

Para todas as informações sobre a evolução da produção de "Tudo Parece Perfeito" podes visitar esta página: https://www.indiegogo.com/projects/tudo-parece-perfeito-everything-seems-perfect.

Da minha parte resta-me agradecer ao Costinha a.k.a. Magazino, por toda a força que me (nos) tem transmitido com os seus "posts" nas redes sociais e com as suas mensagens pessoais de incentivo.
Muito obrigado!

É uma força da natureza e eu tenho a certeza que vai ultrapassar todas as batalhas que ainda tem pela frente, como tem ultrapassado as muitas que já teve até agora.

Ele é o verdadeiro campeão.
 
Carlos Manaça
DJ e Produtor
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
terça, 16 abril 2019 19:39

DJs vs Produtores Musicais

A indústria da música é um mistério para todos os que estão de fora. As portas para entrar são muitas, mas pouco nítidas. Existem vários caminhos a percorrer, mas estão todos intercalados. 

Na música eletrónica um dos primeiros dilemas é por onde começar. Vou ser DJ ou vou ser Produtor Musical? Queremos ser os dois, mas será que essa é a solução para todos?

Um DJ não tem de ser um Produtor e vice-versa, cada um tem um papel dentro da indústria e o caminho a percorrer está diretamente relacionado com o objectivo de cada um.

O DJ é um entertainer, um intérprete das músicas que toca. Os seus talentos passam pela selecção da música, pela presença de palco e pela capacidade de ler a multidão que tem à sua frente. O seu grande desafio é pôr até a pessoa mais tímida, no fundo da plateia, a dançar. Não é um trabalho fácil. Cada espectáculo exige preparação, capacidade de interpretação e uma energia equivalente àquela recebida pelas dezenas, centenas ou milhares de pessoas que têm à frente.

O produtor não precisa de ser um entertainer. O processo de criação de áudio requer outro tipo de competências. É um processo igualmente criativo, mas mais longo e mais solitário. Precisa de existir uma capacidade de apreciar e absorver vários estilos de música e, mesmo assim, criar algo completamente diferente. 

Embora seja comum no meio associar imediatamente o DJing e a Produção Musical à música eletrónica, ambos os profissionais têm um leque de competências que vão muito além deste universo. Um apaixonado pela música eletrónica tem dúvidas por onde começar, porque as vê como complementos, imagina-se como um DJ de festas e festivais que pretende produzir as próprias músicas. 

No entanto, num contexto de formação, é importante que no início do seu percurso sejam guiados, mostrando-lhes as diversas carreiras que podem percorrer, e que cada caminho é infinitamente mais abrangente do que o preconceito inicial. Como em qualquer área de formação e desenvolvimento, é necessário entender que o futuro é incerto e que uma formação sólida numa dada área pode resultar numa carreira promissora por caminhos não previstos. É nestes caminhos alternativos que as duas áreas se separam e cada um deve analisar qual a opção que reúne competências que o possam levar a trajetos profissionais mais promissores e nos quais se sentirá mais realizado.

Ainda que um DJ possa estar mais associado à música eletrónica, a festas, clubes ou festivais, e que esse seja o grande sonho de um jovem aluno, o futuro pode reservar-lhe a uma carreira de sucesso na rádio, relegando as festas para complemento esporádico ou apenas hobby. Neste caso, as competências de Produção Musical serão pouco mais do que um saber que não ocupa lugar ou mais uma ocupação de tempos livres.
 
Por outro lado, um produtor musical, poderá escolher ao longo do seu percurso dedicar-se à produção de música para outros, sejam eles DJs ou bandas, etc. O conhecimento técnico e criatividade de um produtor musical pode levá-lo até carreiras ainda mais distantes da sua ideia inicial, fazendo carreira na televisão, cinema, rádio ou até no desenvolvimento de músicas para a indústria dos videojogos. Tudo o que precisa de acompanhamento de música precisa das competências de um produtor musical. 
 
Se já andas com o "bichinho" da música, seja eletrónica ou não, começa por pensar em que contexto é que gostarias de te inserir. Alarga o leque de opções e entende que decisão te pode abrir mais portas com que te identifiques. Esse primeiro passo vai-te ajudar a aproveitar ao máximo o tempo de aprendizagem. 

Se o teu objectivo é entreter uma multidão, então vais querer ser DJ.
Se gostavas de fazer a banda sonora de um filme, vais querer ser produtor musical. 
Se gostavas de fazer criar efeitos sonoros para um jogo de playstation, vais querer ser produtor.
Se gostavas de passar música na rádio, então, se calhar, queres mesmo ser DJ.
E os exemplos continuam.

A verdade é que não estás limitado a um ou outro, podes ser os dois, podes não querer perder a oportunidade de tocar o teu próprio som. As opções são infinitas e nós não podemos escolher por ti. Esperemos que isto tenha ajudado, pelo menos a definir prioridades e a alinhar objectivos.
 
AIMEC
Academia Internacional de Música Eletrónica
Publicado em AIMEC
sexta, 17 junho 2022 09:58

Circle Of Life

Longe de mim pensar que após uma longa pandemia, que forçosamente parou a minha atividade, iria prolongar a já bastante e sofrida "pausa".
E assim foi, estávamos no início do segundo trimestre de 2021 quando tive a melhor notícia da minha vida, não que ia retomar a atividade (algo que muito ansiava), mas sim que ia ser mãe. Algo que confesso, até muito recentemente não estava nos planos, mas como tenho referido, foi das coisas boas que a pandemia trouxe!

Óbvio que tive que atrasar os planos do regresso, numa altura em que as notícias da abertura dos espaços noturnos e eventos começavam a surgir. Foi um reformular automático e muito natural e o foco principal ficou naturalmente na maternidade.

Do "brainstorm" para o regresso surgiu a temática "Circle Of Life", ou seja o Círculo da Vida. Foi um tema que surgiu de forma muito espontânea e a meu ver não podia ter sido melhor. Consegui fazer um tipo de fusão com o facto de ser mãe e a tour de regresso, que de seguida preparamos. Posso dizer que juntei o melhor dos dois mundos e de certa forma, fazer também, uma referência ao que de melhor a vida tem.

Muito naturalmente também foi todo o processo que se seguiu, onde passei muito tempo em estúdio, dando origem a temas lançados recentemente como "Safemoon", "Indication", "Where We Are", "Elevate" remix e outras mais que vão sair durante este ano, posso adiantar em primeira mão que uma irá-se intitular "Circle Of Life"!

Depois da temática surgiu o passo seguinte, projetar a "Circle Of Life" Tour, que vai ter lugar até ao final do presente ano (2022), e vai passar por alguns dos meus clubs e eventos preferidos.

E para o arranque, nada melhor que um dos clubs mais épicos, "antigos" e respeitados de Portugal, a Pedra do Couto. O evento teve lugar no passado sábado 7 de maio e foi fantástico! Adorei e foi sem dúvida muito bom estar finalmente de regresso a fazer o que mais gosto e rodeada de toda a energia positiva que se sentiu nessa noite.

Posteriormente, vou passar por todo o território nacional e ilhas, assim como os Estados Unidos da América, Luxemburgo e Suíça já confirmados também. Com esta tour pretendo assinalar o ano mais importante da minha vida a nível pessoal em paralelo com a minha carreira como artista.

Posto isto, posso dizer que estou a viver uma experiência tão boa que nunca pensei que fosse possível sentir algo tão forte. É sem dúvida muito gratificante sentir todo o apoio que tenho recebido nesta fase, sentir um amor inexplicável e regressar às cabines e ver ainda mais carinho à minha volta! 

Estou de regresso e preparada para espalhar toda esta boa "vibe" contagiante a todos os que me acompanharem!

A vida é feita de ciclos, cabe-nos fazer deles o melhor possível.
 
Publicado em Miss Sheila
terça, 12 novembro 2019 22:06

Quanto vale o "TOP 100 DJs" da DJ Mag?

No passado dia 19 de Outubro foram revelados os resultados de mais um "DJ Mag Top 100 DJs" e mais uma vez, com polémica. Os irmãos Thivaios mais conhecidos por Dimitri Vegas & Like Mike ganharam pela segunda vez (a primeira tinha sido em 2015) e voltaram novamente as acusações de "marketing agressivo" e "caça ao voto" para o "Top 100" da revista inglesa. Já em 2015 foram acusados de que o seu management tinha contratado uma vasta equipa de promotoras para visitar vários eventos onde eles actuavam que, de iPad's na mão com a página aberta e já preenchida com o nome da dupla na votação do Top 100 da revista, pediam o voto a quem estava no evento. Essa equipa da promotoras chegou mesmo a andar por todo o festival Tomorrowland em 2015 (festival co-produzido pela ID&T, empresa que representa a dupla Belga), com os famosos iPad's a pedir o voto para a dupla e não permitindo votar em outros nomes quando alguém lhes dizia que Dimitri Vegas & Like Mike não eram os seus artistas favoritos e queriam votar noutros nomes.
 
Já em 2013 a dupla levantou alguma polémica quando teve uma subida fantástica no "Top 100" da revista Inglesa, passando do lugar 38 em 2012 para a sexta posição em 2013 quando em 2011 tinham entrado pela primeira vez para a posição 79. De 2011 a 2013 tiveram uma subida de 73 lugares no "Top 100" da DJ Mag e tudo devido, segundo algumas pessoas ligadas ao meio, a uma política muito agressiva de marketing direcionado (quase) exclusivamente a pedir o voto para a lista da revista inglesa.

É certo que o "Top 100" da DJ Mag sempre esteve envolto em algumas polémicas, mesmo quando a votação era feita através do envio dos cupões da revista por correio. Fui assinante da revista durante cerca de 20 anos e lembro-me de ler algumas críticas que diziam que já nessa altura a revista "aconselhava" os artistas a fazerem publicidade nas suas páginas como forma de atingir os potenciais votantes e de artistas como Paul Van Dyk, Ferry Corsten e Armin Van Buren (que lideraram a tabela durante vários anos) reconhecerem que gastavam entre 10.000 a 15.000 libras ao ano em publicidade na revista inglesa.

Com o aparecimento das redes sociais a relação dos artistas com o público alterou-se totalmente, passou a ser mais directa, mais pessoal, e as suas campanhas de marketing começaram a usar os "social media" para chegar mais facilmente ao seu público alvo, deixando de usar quase exclusivamente as páginas das revistas especializadas para o fazer. De qualquer forma, o "Top 100" da revista inglesa continua a ser a sua principal fonte de receitas, quer através da publicidade no formato físico, quer na sua página web e tornou-se numa das principais referências de quem contrata artistas para grandes eventos e festivais especialmente de EDM, nas suas varias vertentes, representando uma subida de cachet muito importante para quem colocar ao lado do seu nome a indicação "#1 DJ Mag Top 100 DJs", representando por isso muito dinheiro. Logicamente os artistas/managers apercebendo-se disso, começaram a usar todos os meios ao seu dispor para chegar ao mais alto possível da tabela, sabendo que isso lhes pode acrescentar um valor importante ao seu cachet.
 
O "Top 100" da revista inglesa continua a ser a sua principal fonte de receitas, quer através da publicidade no formato físico, quer na sua página web e tornou-se numa das principais referências de quem contrata artistas para grandes eventos e festivais.

Há no entanto algumas diferenças entre os artistas de topo sobre a maneira como encaram a sua posição neste "Top 100". Enquanto alguns (como Dimitri Vegas & Like Mike, entre outros) gastam verdadeiras fortunas em campanhas online a pedir o voto e em publicidade, há outros que referem que "nunca pediram, nem vão pedir o voto para este tipo de votações". Ainda recentemente Martin Garrix o disse numa entrevista, apesar de ter sido o número um, três anos consecutivamente, 2016, 2017 e 2018.


É um facto que muitos dos artistas da chamada electrónica "não comercial", mesmo aqueles que entram na lista, dizem não dar importância a este "Top 100 DJs" (muitos deles até o ridicularizam, especialmente nos últimos anos) mas o que é certo, é que a sua posição na tabela da revista inglesa influência muito alguns mercados na hora de decidir a contratação para alguns dos eventos/clubes mais importantes. 

A Ásia e o Brasil são dos locais que mais olham para o "Top 100" da DJ Mag, são dois mercados enormes e que representam muito dinheiro para os artistas. Por esse motivo, para muitos deles, especialmente os do circuito mais "mainstream", estar no "Top 100" ou não estar, pode alterar significativamente o valor que vão facturar ao longo do ano, e por isso apostam muito na publicidade nas redes sociais (e não só) para pedir o voto ao seu público para os ajudar a subir o mais alto possível sabendo que isso vai subir consideravelmente o cachet em muitos locais.

Uma das acusações que mais ouço e leio ao "Top 100" da DJ Mag é que deixou de ser um top de DJs para ser um concurso de popularidade, onde (quase) qualquer pessoa pode entrar desde que aposte numa campanha de marketing agressiva e junto dos mercados certos. Mas a realidade é mesmo essa, o "Top 100" da revista britânica há muito que não é um "Top 100 DJs" (apesar do nome) mas sim uma tabela de popularidade dos artistas! Esse é o erro de muita gente que ainda teima em ver este top como uma lista dos melhores DJs e produtores, quando na minha opinião há muito que não o é. Especialmente com o aparecimento do EDM, com todos os milhões (em facturação e em pessoas) que envolve anualmente, o "Top 100 DJs" é uma tabela dos artistas mais populares, com mais seguidores nas redes sociais e que participam nos eventos com mais repercussão mediática, que nestes últimos anos têm sido os eventos de música electrónica mais "mainstream".
 
Mas a realidade é mesmo essa, o "Top 100" da revista britânica há muito que não é um "Top 100 DJs" (apesar do nome) mas sim uma tabela de popularidade dos artistas!

Obviamente a popularidade dos artistas também vem do seu bom trabalho, dos seus bons sets nos grande eventos/clubes, do sucesso dos seus temas na rádio, nas listas de vendas, etc. Pelo menos deveriam ser esses os factores mais importantes, na minha opinião, para a popularidade do artista. Mas o certo é que se todo esse bom trabalho que o artista faz, nas várias vertentes, não for bem divulgado, à escala global, este não atinge a popularidade que necessita para um dia poder entrar numa lista como o "Top 100 DJs". Por isso, na minha opinião, há muitos anos que este "Top 100 DJs" é um concurso de popularidade e é assim que o devemos ver.  (Os meus parabéns ao Kura e ao meu amigo Diego Miranda pelas posições #40 e #55).


Talvez para calar um pouco as críticas que sempre aparecem quando são divulgados os 100 nomes do "Top 100 DJs" a revista inglesa criou em 2018 o "Alternative Top 100 DJs" com a colaboração da maior loja online, o Beatport. Esta lista é feita com base nas votações do "Top 100 DJs" normal juntamente com as vendas dos temas dos artistas no Beatport e para muitos é a "verdadeira" lista dos melhores DJs e produtores do momento. Para mim é sem duvida o "Top 100" que melhor reflecte quais os artistas mais destacados dentro da música electrónica nos seus vários estilos (com toda a subjectividade que uma lista deste género pode ter) uma vez que contam também os números de vendas dos seus temas e não só a votação dos fans. 

Por cá e felizmente com muito menos polémica está a decorrer até dia 20 de Novembro a votação para o "Top 30" da 100% DJ. Para apoiarem os vossos artistas favoritos basta escolherem 4 nomes e votar online em www.top30deejay.pt. Já faltam só 8 dias para terminarem as votações!
 

Carlos Manaça

DJ e Produtor

www.facebook.com/djcarlosmanaca

 

(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)

Publicado em Carlos Manaça
sábado, 14 abril 2018 22:47

O DJ e a (in)capacidade de integração

Muitas vezes me perguntam a opinião acerca do actual estado da noite e do mercado de trabalho para os DJs nacionais. Apesar desta ser uma temática bastante complexa, basta recuarmos uma dezena de anos para facilmente conseguirmos encontrar um paralelismo que de certa forma ajuda a responder a esta pergunta. Será fácil para mim e todos os meus colegas conseguirmos nomear pelo menos quinze ou vinte clubes dessa altura que geriam as suas programações baseadas não nas exigências musicais acentuada dos seus clientes mas sim numa política de gestão daquilo que eles próprios consideravam importante para oferecer uma real e sustentada personalidade e identidade para as suas casas. Era relativamente usual vermos todos os fins de semana vários artistas nacionais a viajarem de Norte a Sul do país, criando desta forma uma dinâmica de indústria que acabava por ser benéfica para uma classe que paulatinamente ia criando os alicerces imprescindíveis para conseguir atingir um nível de profissionalismo condizente com as exigências de um mercado em pleno crescimento.
 
O problema, na minha opinião, surgiu quando as regras mudaram de um momento para o outro. O nosso país entrou em crise, trazendo com isso sérias consequências aos mais variados sectores da nossa sociedade, incluindo, como é óbvio, as artes. As rádios abriram o filtro numa tentativa de conseguir cativar cada vez mais ouvintes e a televisão não demorou a fazer o mesmo, já para não falarmos do facto de que a maioria da população portuguesa passou a dispor de Internet de uma forma praticamente livre, o que a tornou uma ferramenta magnífica que dava a todos a possibilidade de se educarem a eles próprios, neste caso específico musicalmente. Esta opção soa, por si própria bastante interessante, termos a possibilidade de ouvir o que muito bem entendermos não só é um feito amplamente merecido mas também uma grande vitória na livre expressão de um povo, nomeadamente na procura de informação, especialmente nós, que não à tanto tempo assim saímos de um ditadura que nos impedia inclusivamente de estar em contacto com novas formas de expressão artística. 

(…) tornou-se automaticamente muito mais difícil gerir e programar um espaço de dentro para fora, uma vez que as pessoas passaram a querer ouvir nas pistas de dança o que ouviam no carro ou em casa.

 
Mas com todas estas boas notícias surgiram também algumas menos positivas. Devido ao facto de muito rapidamente nos termos apercebido de que, comercialmente falando, cada pessoa acaba por ter a sua própria maneira de apreciar a música, tornou-se automaticamente muito mais difícil gerir e programar um espaço de dentro para fora, uma vez que as pessoas passaram a querer ouvir nas pistas de dança o que ouviam no carro ou em casa. Com isso rapidamente a personalidade e identidade de um clube passou para segundo plano, fazendo com que os empresários deixassem de se poder dar ao luxo de pensar a médio longo prazo, tendo que começar a repensar todas as decisões comerciais dos seus espaços, incluindo a parte da programação musical, que passariam a ter nas suas cabines. De um momento para o outro, o DJ nacional que não fosse musicalmente "acessível" ao que a partir daquela altura os responsáveis dos espaços necessitavam, acabaram por lentamente começar a ser postos de lado, muito por culpa dos cachets que a partir dessa altura começaram a ser considerados altos e não justificados devido ao facto do estilo de determinado artista não se enquadrar com a política musical adoptada por determinado espaço. 

O que importava era o lucro fácil e rápido,  tanto por uma questão concorrencial como principalmente para se conseguir fazer frente a compromissos financeiros, algo absolutamente compreensível para quem, como eu próprio, também tem negócios na Indústria da noite além da música, mas que facilmente retira consistência e preponderância para algumas das características principais que um espaço que oferece um serviço de diversão nocturna deveria proporcionar aos seus clientes, a diferença, qualidade e identidade em que tanto me foco nesta crónica e que como é evidente também se reflecte no tipo de consumos que uma clientela de circunstância oferece, afinal um risco que se corre quando se quer encher uma casa a qualquer custo. Consequência natural de todas estas mudanças foi o facto de ano após ano vermos clubes que ainda tentavam seguir a política do "elitismo", como então lhe passaram a chamar, a fecharem portas, incapazes de contrapor uma política de qualidade com o facilitismo auditivo com que os grandes grupos cada vez mais acenavam. Começou-se então a culpar o DJ nacional pela sua "incapacidade de integração" no circuito e voltámos por exemplo a apostar nos grandes nomes internacionais, o que longe de ser mau em muitos casos, camufla um problema muito grande, que é o facto de que o que é nosso ter cada vez menos espaço para trabalhar, pelo menos por valores equitativos com o seu valor, até porque não nos podemos esquecer de que não são só os artistas internacionais que vivem exclusivamente da música.

Posto isto chegamos ao estado do nosso mercado actual, que se resume a quatro opções quando se pensa no curto prazo: opção um, apostamos em nomes internacionais quando queremos ser "elitistas", porque assim não se chateia ninguém, afinal de contas está na moda e pode passar as músicas que quiser, até porque, opção dois, temos um DJ residente que resolve tudo porque sabe e tem as músicas todas que lhe vierem pedir, faz toda a gente feliz e melhor que tudo, cobra tanto como um funcionário qualquer do clube. Opção três, temos aqueles rapazitos que conhecem toda a gente, até passam música com os cotovelos e em tronco nu se for preciso e trabalham tão bem como o DJ Residente e por último como opção quatro temos aquele artista com 10, 15 ou 20 anos de Carreira, que lutou anos a fio pelo respeito e reconhecimento de uma profissão que no início era tudo menos apaixonante ou cheia de glamour mas que aqui e ali não tem as músicas que toda a gente conhece e certamente não se importará de trabalhar por um cachet simpático (aos olhos dos proprietários dos espaços) para ter o seu nome num alinhamento com um grande nome internacional, afinal já tem tão pouco trabalho que até o estamos a ajudar. É lógico que como resultado final, a vertente identidade e personalidade acaba claramente por ficar comprometida, mas no final o que interessa é que tenhamos fotografias com a casa cheia, os compromissos financeiros resolvidos e dinheiro em caixa, se bem que esperando ao mesmo tempo que ninguém se lembre de abrir um novo espaço por perto, porque não convém, pode-se perder freguesia e isso não interessa a ninguém, especialmente depois desta trabalheira toda que tivemos a preparar tudo como eles gostam.

Que fique bem claro que não pretendo de maneira alguma minimizar o trabalho de alguns excelentes clubes, DJs residentes ou DJs nacionais e internacionais que continuam a estar no nosso circuito de trabalho, muitos deles meus amigos que muito admiro e que valorizam a nossa indústria, esta crónica tem um teor claramente generalista que reflecte, na minha opinião, uma situação geral e nunca individual, estando obviamente centrada única e exclusivamente na temática DJ, uma vez que olho para o tema DJ/Produtor como uma realidade completamente diferente e que será inclusivamente tema para uma futura crónica.
 
Carlos Vargas
Publicado em Carlos Vargas
domingo, 19 abril 2020 15:00

O impacto da pandemia na música

A pandemia devido ao novo COVID-19 chegou e é bem real. Já todos sentimos o grande impacto de todas as medidas que tiveram (e continuam a ter) de ser adoptadas pelo governo e Direção Geral de Saúde.

Assim sendo e inevitavelmente a minha crónica vai ser à volta deste tema, em particular da música electrónica, que como todos sabem, é a minha área.

Tendo em conta o grande risco de contágio, artistas como eu que vivem da música, assim como da cultura no geral, fomos dos primeiros a sentir todas estas drásticas acções que foram implementadas, tendo inicialmente numa grande maioria e de livre e espontânea vontade terem sido encerrados teatros, cinemas, museus, exposições, concertos, festivais, clubs, etc. Foi de uma enorme consciência e com imenso sacrifício que vimos isto a acontecer, antes do confinamento obrigatório. Lamentavelmente mas para o bem mútuo continuamos na mesma situação. 

O que não está bem a meu ver, são as medidas de apoio que não estamos a receber ou a ser implementadas. Dou como exemplo a tentativa do nosso Ministério da Cultura em apoiar certas entidades, numa fase em que ainda não atingimos o pico e a luz ao fundo do túnel ainda se encontra um pouco longe. Lançar um evento como o "Tv Fest" onde seriam apoiadas (e muito bem), mas apenas algumas entidades (aqui está um dos erros a meu ver).

Este projeto, criado pelo Governo no quadro de apoio, no âmbito da crise causada pela pandemia COVID-19, e destinado "exclusivamente" ao setor da música, tinha estreia marcada para quinta-feira 9 de Abril, no canal 444, nos quatro operadores de televisão por subscrição em Portugal e na RTP Play. 

De acordo com a ministra, seriam abrangidos "160 músicos", "de todos os estilos musicais", a quem era pedido que "envolvessem sempre equipas técnicas", o que significaria o envolvimento de "cerca de 700 técnicos", ao longo dos vários programas. Depois de anunciada, a iniciativa foi criticada por vários músicos, sendo lançada uma petição online - em menos de 24 horas, mais de 16 mil pessoas subscreveram essa petição. O Festival foi desta forma suspenso, mas não cancelado, de forma a supostamente ser repensado.

Estamos, sem dúvida, a passar uma fase que nunca pensaríamos e enquanto refletimos nisso as coisas no geral vão ficando piores. As medidas de apoio têm que ser implementadas e surgir com uma visão mais abrangente e global, onde o benefício deverá ser repartido igualmente ou então beneficiar os que passam mais dificuldades, como é o caso de entidades mais pequenas ou mesmo locais, uma análise do lucro individual "versus" os gastos, seriam uma boa equação para chegar a um resultado mais satisfatório e justo, porque a realidade é que estamos todos no mesmo barco, e não apenas a secção mais "mainstream", que foi a "fórmula" desenhada para direcionar esta iniciativa. 

Por outro lado, numa outra instância, acho que o que deveria ser realmente feito era canalizar esses fundos para o nosso SNS e a luta da frente contra o vírus. 

No meu caso em particular, estou, como todos sabem, com os eventos suspensos, algo que foi também comunicado muito antes de ser obrigada a faze-lo, tanto eu como a minha agência achámos por bem antecipar tudo isto que viria a acontecer, por nós e por todos. Vou acompanhado positivamente o desenrolar da situação e mantendo todos os cuidados necessários e sugeridos pela DGS. 

Como artista que sou, a minha função é divulgar a música electrónica em paralelo com divertir as pessoas, e agora mais que nunca isso é necessário, algo que também estou a fazer, através de livestreams, publicações e outras ações em que decidi participar.

Para ocupar o meu tempo, tenho estado no estúdio onde ouço diariamente bastante música nova, estou a preparar novos releases meus e da minha editora Digital Waves, assim como a gravar o meu Radioshow semanal na Nova Era e mensal na Nove3Cinco. Tenho feito também exercício por casa e mantido uma alimentação relativamente saudável.

Nesta fase é muito importante manter o positivismo, e, claro, dentro dos possíveis ficar em casa ou da forma mais segura possível, manter a actividade física e fazer o máximo por assegurar o bom funcionamento do sistema imunitário.

Tudo vai passar, tudo vai ficar bem, mas agora temos que pensar em nós e naqueles que diariamente arriscam as suas vidas para combater esta pandemia que nos apanhou de surpresa. Agora, não vamos deitar tudo a perder e recomeçar o confinamento de novo... está nas nossas mãos. 

Quero aproveitar para deixar um sentido agradecimento aos nossos "heróis" que têm sido incansáveis: médicos, enfermeiros, transportadores, staff dos supermercados, farmacêuticos, trabalhadores de companhias aéreas, motoristas de transportes públicos, etc. 

Fiquem seguros, olhem pela vossa saúde e pela dos outros, vamos voltar a dançar até de manhã com sorriso de orelha a orelha, mas agora temos que lutar, todos juntos!

Esta crónica foi redigida a 13 de Abril 2020, pelo que atendendo à conjuntura atual, pode ficar desatualizada num curto período de tempo.
 
Publicado em Miss Sheila
Confesso que tenho saudades de ouvir um "prego". Tenho saudades de ouvir o ruído de uma agulha num vinil sujo, da agulha a saltar e um DJ a "desenrascar" uma passagem, de uma mistura menos acertada e um beat mais ao lado. 
 
A era do educador musical acabou. A saída à noite para ouvir aquilo que não oiço em casa ou no carro terminou. O DJ deixou de ser aquela pessoa admirável, dotado de uma técnica de mistura invejável, de uma noção e cultura musical que debitava sonoridades que nunca tinha ouvido. É certo que ainda existem alguns e há clubes ou eventos onde podemos ver estes indivíduos em "vias de extinção" mas são cada vez mais raros... São raros porque não conseguem sobreviver com a mudança e a banalização que se tornou a profissão chamada DJ. 
 
Hoje em dia vemos o dono da casa DJ, o actor DJ, o RP que também é DJ, o indivíduo que apareceu num reality-show como DJ e até menores de idade são DJs. Tudo é DJ.
 
O DJ já não é o "mestre dos pratos ou dos decks". Hoje em dia o DJ é aquele que não conseguiu vingar na profissão que escolheu ou aquele que não sabe fazer mais nada. 
 

Antigamente o DJ gastava dinheiro no que realmente interessava... a Música.

 
Ninguém "compra" o verdadeiro DJ. Esses estão todos no desemprego ou a passar dificuldades. Já ninguém quer saber se sabes acertar uma batida (à unha), se a tua escolha musical é diferente e com qualidade. Ninguém quer saber se consegues tocar seis horas seguidas, se consegues mandar os clientes de um clube ao bar para consumir e voltar a agarrar uma pista de dança ou se consegues ter uma sequência musical para manter os clientes várias horas no clube. Esse DJ desapareceu (ou está no desemprego). 
 
Hoje em dia o DJ teve de inventar. Tem de falar ao micro (não sendo MC), solicitar todo o tipo de "adereços" (CO2, confetis, etc.), ter boa imagem, bons vídeos para passar enquanto actua, gastar milhares de euros nas redes sociais e na sua promoção e ter uma equipa a trabalhar com ele (que também tem de ser paga). Antigamente o DJ gastava dinheiro no que realmente interessava... a Música.
 
Não sou daqueles que são contra a evolução e as novas tecnologias, nem contra as formas que foram encontradas para divulgação e promoção da música electrónica. Sou apenas contra o uso da palavra DJ para definir pessoas que não são mais que animadores e que nem de "toca discos" podem ser chamadas. 
 

O DJ (na sua verdadeira essência da palavra) está em "vias de extinção" e eu tenho saudades de os ver e ouvir.

Ninguém quer contratar um DJ nos dias que correm. Não vamos confundir as coisas. O DJ como o conhecemos está a morrer. Hoje em dia o que é contratado é um produtor que vai usar um equipamento essencialmente de software para difundir o que produz e alguma música que ouvimos na rádio. Poucos são aqueles que se podem dar ao luxo de efectuar uma actuação sem colocar uma única música conhecida ou pelo menos um remix ou edit de algo que todos estão fartos de ouvir.
 
O DJ (na sua verdadeira essência da palavra) está em "vias de extinção" e eu tenho saudades de os ver e ouvir. Fico feliz por ver a evolução que a música electrónica teve e como se tornou global, mas por favor, não usem mais a palavra DJ porque de "Discos" não tem nada e de arte para os usar nada tem.  

 

Ricardo Silva
Publicado em Ricardo Silva
terça, 01 abril 2014 16:16

(Sem título)

Escrever nunca é fácil.
Sobretudo quando se trata de uma primeira vez: os temas escorregam, misturam-se e nem sempre à velocidade certa.
Andei com dúvidas. Queria falar sobre o Djiing no feminino. Não, quero falar das novas sonoridades. Não, quero falar da noite no geral. E, afinal, quero só contar uma história.
 
Hoje quando me sentei na minha Workstation, chuva de primavera a bater na janela, gata com fome, assuntos por resolver, era um dia que começava como os outros. Vi os mails, abri o Facebook e entre os posts delirantes de um 1 de Abril cinzento a noticia da morte de Frankie Knuckles. 
 
Pus o Your Love a tocar.
Homenagem pequena. Era eu também assim, pequena, quando aprendi a gostar de House Music. A minha entrada na rádio tratou de me afinar o ouvido, de me mostrar sonoridades que estavam longe dos meus hábitos e que tinham essa capacidade. A de me levar para longe.
 
Quando, anos depois, pensei que poderia ser uma musical contadora de histórias: ele estava lá. Referencia, reverência. Inspiração. Intocável.
Tal e qual está agora. Ah, a p*ta da insustentável leveza da vida. 
Lugar-comum, tanta verdade nunca antes dita: hoje ficamos mais pobres. Mas depois não. Porque se é o imaterial que nos enriquece, então temos hoje mais de estrela do que pó. Numa House Music pura, bonita, cheia de bom feeling. Pode ser que já não se ouça. Tanto melhor porque é coisa que se sente.
 
Como sempre, para sempre: obrigada pela inspiração. São breves linhas, as tais difíceis de escrever. Mas são a única coisa breve da tua partida, porque o que nos deixas é muito maior do que algum dia poderias imaginar. Há legados que não morrem. Mesmo assim, esta poderia ser uma mentira de 1 de Abril.
See you on the dancefloor, godfather.

 

Publicado em Mariana Couto
quarta, 19 abril 2017 19:19

Portugal, país de oportunidades

Numa altura em que o "mercado dos DJs" atravessa uma nova fase, as oportunidades para os novos artistas são mais que muitas. Acabo de chegar das viagens de finalistas e do Festival do Secundário onde dezenas de DJs tiveram a sua oportunidade de mostrar o seu trabalho. 
 
Muito se fala da falta de apostas em novos talentos mas a realidade é que existe uma crescente oferta no mercado que, a meu ver, é tudo menos benéfica para quem está a dar os primeiros passos. São criadas falsas ilusões que inflamam o ego e criam expectativas erradas nos novos DJs. Actuar para centenas ou milhares de pessoas em início de carreira é o maior erro que alguém pode cometer se não tiver "cabeça" para perceber que ninguém estava presente nesses eventos para os ver/ouvir e onde já existe um público com disposição para ouvir uma determinada sonoridade.
 
A desilusão e a revolta é o que se segue. Muitos destes DJs ficaram a pensar que tudo é fácil, tudo vai acontecer sem esforço e que o telefone ou o mail vão receber contactos. Não podiam estar mais errados. 
 
Em todos os anos que trabalhei com DJs, já tive oportunidade de efectuar marcações para praticamente todos os grandes palcos Nacionais e com artistas diferentes. Todos eles (DJs) tiveram de perceber que não é uma actuação que os vai catapultar e manter no mercado. Assim que uma actuação termina, todos têm de ter a noção que estão "desempregados" até à próxima actuação e que há trabalho para ser feito. Não é por terem actuado no Rock In Rio, Sudoeste, Expofacic, Queima das fitas ou numa viagem de finalistas que a sua carreira está lançada e consolidada. 
 
Quantos DJs e Produtores tiveram "hits" ou tocaram nos melhores palcos e clubes nacionais e de um momento para o outro desapareceram? Basta pensarmos um pouco e encontramos uma "mão cheia" de grandes nomes que "desapareceram" do mercado. 
 
Todas as semanas recebo pedidos de novos DJs a "reclamar" por oportunidades. Todos eles esquecem-se que as oportunidades não surgem com a marcação de uma actuação e que o que estão a pedir só pode partir deles próprios. Cada novo DJ/artista tem de criar e procurar a sua "oportunidade" e ela não está numa actuação num palco ou cabine. 
 
A oportunidade que procuram está na sua capacidade de trabalho, empenho, investimento e perseverança. É o próprio DJ/artista que tem de criar à sua volta um grupo de pessoas que o sigam, que o queiram ouvir e que apreciem o seu trabalho. Quando tiver alguém que pague para o ver/ouvir, garanto que haverá quem o contacte para actuar porque isto é um negócio. 
 
Esqueçam aquelas palavras do "amo o que faço", "ser DJ é uma arte", "a minha musica é boa mas ninguém a houve porque não toca na radio", etc. 
As produtoras, editoras, rádios, TVs, etc. vivem e conseguem manter as portas abertas com dinheiro e não com "amor, arte e boas intenções". 
 
Sim... Portugal é um País de oportunidades mas não há quem trabalhe de borla. A indústria musical e do entretenimento precisa de novos talentos e "sangue novo". Ninguém está disposto a investir tempo e dinheiro em alguém que ainda não provou que esse investimento vai dar retorno. 
 
A "oportunidade" tem de ser criada. Não é com uma agência/agente ou investidor que essa oportunidade vai surgir. Tem de partir do DJ/artista e não basta ter qualidade (ou achar que tem). É preciso investimento de tempo, dinheiro, trabalho e perseverança para se conseguir atingir os objectivos.

Ricardo Silva
DWM Management
Publicado em Ricardo Silva
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